2 de jan. de 2008

Poliandria no Quilombo de Palmares


Palmares reproduzia, dentro de suas fronteiras, a desproporção de sexos existente entre a população escrava. Esse desequilíbrio ocorria porque os senhores de escravos preferiam comprar homens jovens a mulheres e os traficantes procuravam suprir essa demanda. Calcula-se que, para cada mulher, havia três ou mais homens (variando com a área), fato que se irá refletir na composição por sexos da população palmarina. Se no quilombo fosse mantido o casamento monogâmico que os senhores de engenho impunham em suas fazendas, haveria um desequilíbrio familiar tão agudo que a desarticulação social seria inevitável. Instituiu-se assim a poliandria (na qual uma mulher tem vários parceiros sexuais concomitantes e com eles tem vários filhos), como assim descreveu um negro infiltrado em Palmares a mando de um grande proprietário de terras "...a cada escravo fugido que chega em Palmares é dado pelo conselho de justiça uma mulher, à qual possui junto com outros negros - dois, três, quatro ou cinco - pois sendo poucas as mulheres, lá adotam esse estilo para evitar contendas..." Entretanto, ao contrário do que acontecia com a maior parte da comunidade, os membros da estrutura de poder (como o rei e possivelmente os chefes de mocambos) praticavam a poligamia - Ganga Zumba tinha três mulheres, duas negras e uma mulata, enquanto Zumbi teve também algumas, havendo a hipótese de que uma delas era branca.

Recomendação do dia: O livro "Rebelião Escrava no Brasil", de João José dos Reis, ed.Companhia das Letras, um estudo cuidadoso do levante urbano ocorrido em 1835 na cidade de Salvador e que foi liderado por nagôs muçulmanos nascidos na África.

1 de jan. de 2008

O Papa e a História


Esperou em vão quem sonhava que o papa, em sua última viagem ao Brasil no ano de 2007, pedisse perdão pelos erros cometidos em nome da fé no continente sul-americano. Os sucessivos pedidos de perdão que foram a marca de João Paulo II não encontram eco na consciência de Bento XVI. Para ele, aqui não se travou uma guerra colonial que dizimou populações inteiras de ameríndios, num processo de evangelização legitimado pela superioridade da fé católica de cristãos portugueses e espanhóis. Líderes indígenas consideraram as declarações do papa "arrogantes e desrespeitosas". Eles discordam da tese de que a Igreja Católica os tenha purificado e que retomar suas religiões originais seja um retrocesso.
Num discurso para os bispos latino-americanos e do Caribe no encerramento de sua visita ao Brasil, o pontífice distorceu um pouco a história ao afirmar que a Igreja não havia se imposto aos povos indígenas das Américas. Segundo Bento XVI, os índios receberam bem os padres europeus, já que "Cristo era o salvador que esperavam silenciosamente".
"É arrogante e desrespeitoso considerar nossa herança cultural menos importante que a deles", respondeu Jecinaldo Satere Mawe, coordenador-chefe da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab).

Recomendação do dia: O livro "Da Esperança à Utopia", um testemunho de D.Paulo Evaristo Arns que registra a vida de alguém engajado na construção de uma Igreja nova e contemporânea desde os tempos em que, destemido defensor dos direitos humanos na época da ditadura, aprendeu a ser um hábil e firme negociador no convívio com os donos do poder.